Lançamento do blog “A palavra é uma máscara”
O blog “A Minha Carreira” vai continuar disponível online mas sem a publicação de novos artigos, os quais passarão a ser publicados no novo blog “A palavra é uma máscara“.
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O ministro Augusto Santos Silva decretou que “com o reembolso das despesas o caso fica encerrado”. Mas, como ainda não foi aprovado, nem sequer anunciado, um “código de conduta” que obrigue os portugueses a ouvir e calar, vou, como cidadão, exercer o meu direito de liberdade de expressão e opinar sobre o caso dos 3 Secretários de Estado que foram a França ver jogos do Euro, a convite da petrolífera Galp.
Assim que este caso se tornou público, de imediato surgiu um coro de políticos, jornalistas e comentadores a afirmar que se tratava de um grave erro político, pois os 3 Secretários de Estado, que tutelam áreas onde a poderosa Galp desenvolve atividades, tinham viajado à custa dessa empresa obtendo desse modo vantagens indevidas de foro pessoal.
Para os mais críticos, ao aceitarem as generosas ofertas da Galp, os 3 Secretários de Estado ficaram diminuídos na sua capacidade de intervir nos intricados dossiers em que a petrolífera Galp é parte interessada.
Para analisar os fundamentos desta posição vou recorrer à ajuda de Robert Cialdini, autor do best-seller “Influência, a psicologia da persuasão”, um livro de leitura obrigatória para quem quer compreender como somos levados a fazer coisas contra a nossa vontade.
No livro, Cialdini aborda os 6 princípios da influência, mas para compreender o “caso dos 3 ingénuos” basta conhecer o 1º princípio, o da reciprocidade, que se traduz no sentimento de obrigação de retribuir prendas, convites, favores, etc. Quem não sentiu já a obrigação de retribuir um presente de aniversário dado por um amigo, um convite de um colega de trabalho para jantar em sua casa, ou a ajuda inesperada de um vizinho num dia de aflição? “Este sentimento de obrigação que acompanha o princípio da reciprocidade é uma presença poderosíssima na cultura humana”.
Quase toda a gente, sem exceções, executivos, empresários, políticos e cidadãos já tentaram tirar partido do princípio da reciprocidade, ou seja, da velha prática do dar e receber. Os exemplos são bem conhecidos de todos: as empresas que fazem contribuições para vários partidos, os políticos que nas campanhas oferecem aos eleitores todo o tipo de presentes (de bonés a frigoríficos) e promessas de bem-estar futuro (150.000 empregos), os cidadãos que fazem ofertas a funcionários do Estado e das autarquias, os pais que oferecem presentes aos professores dos seus filhos.
Segundo Cialdini, “ao nível mais alto, os políticos eleitos trocam favores que fazem da política um campo de trocas dos mais extravagantes que conhecemos”. As recentes posições dos partidos sobre o “caso dos 3 ingénuos” e das alterações ao IMI parecem demonstrar que o princípio da reciprocidade é o motor da “geringonça”. As extravagantes trocas entre os partidos que suportam o governo fazem lembrar uma maçónica “Loja Limiano”, inspirada nos famosos Orçamentos do Queijo Limiano de 2001 e 2002.
A propósito do caso Limiano, que teve com principal protagonista o deputado e ex-autarca Daniel Campelo, é oportuno lembrar que “as organizações políticas locais já aprenderam que a principal maneira de manterem os seus candidatos no poder é assegurarem que estes fazem um grande número de pequenos favores” (Cialdini). Por outras palavras, as organizações políticas sabem explorar e tirar vantagens do princípio da reciprocidade, fazendo muitos pequenos favores para receberem muitos votos dos eleitores, com o objetivo de ganharem eleições e se eternizarem nos cargos.
Neste contexto, se os partidos políticos são especialistas na arte de tirar partido do princípio da reciprocidade na sua relação com os eleitores, sem quaisquer preocupações éticas com essa conduta, porque razão vem um ministro anunciar a criação de um código de conduta para as relações entre as empresas privadas e os titulares de altos cargos?
Se a obrigação de dar, a obrigação de receber e a obrigação de retribuir fazem parte da cultura humana, creio que o que faz sentido é o criar um código para orientar e disciplinar a conduta dos políticos na sua relação com os eleitores. O exemplo tem de vir de cima.